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Da Lombardia à Sardenha

Volta pela Europa em 126 dias – Parte IV
          
          Minha nova habilidade de turista por própria conta e risco começou a ser testada assim que saí da estação do metrô em Milão, primeira cidade que escolhi conhecer: haviam iniciado obras naquele dia, as ruas em volta estavam interditadas e as pessoas a quem eu perguntava não faziam idéia de onde era a rua do albergue que eu procurava. Cheguei lá só depois de entrar pelo portão de acesso a um museu (!) e, para encontrar a portaria precisei atravessar um jardim no pátio de uma espécie de hospital (!). 
Nada fácil, mas... Consegui!                                                                                        fotos by: Ira                                                                   
Piazza Duomo, Milão

Peguei mapas, escolhi o que ver, tracei a rota e saí para a rua. Dediquei alguns minutos à Piazza Duomo, à catedral, aos monumentos e gelaterias do entorno. Vi o teatro La Scala, andei pela Galeria Vittorio Emanuele e, de quebra, fui ao Castelo Sforzesco. Tudo o que eu havia selecionado.         

Galeria Vittorio Emanuele, Milão
      Fiquei feliz, vi que as coisas não eram tão difíceis!
   Aquele medo infantil de “me perder” foi cedendo espaço aos poucos ao prazer de estar fazendo exatamente aquilo que sempre sonhei.
         Comprei passagens de trem até Stresa, à beira do Lago Maggiore, segundo maior da Itália. Eu queria conhecer Isola Bella e seu castelo, que haviam me fascinado num divertido conto de Gianni Rodari
          Experimentei outro dia fascinante (igual àquele no Lago di Garda), fazendo tour pelo arquipélago das ilhas Borromeas (MadreBella e dei Pescatori). O Palácio Borromeo é um esplendor barroco em meio a jardins, estátuas e pavões brancos. Retornei a Milão com a sensação de “missão cumprida”, pois eu preenchia os requisitos para tornar-me uma turista capaz de fazer seus próprios roteiros.
Jardins do Palácio Borromeo, Isola Bella

Porta Soprana, Gênova
           
            Próximo porto: Gênova, debruçada sobre o azul do Mediterrâneo. Ao descer do trem, vi que havia uma greve de ônibus. No ponto de táxi, a maior confusão. Grupos de passageiros recém chegados, com quilos de bagagem, tentavam subornar os taxistas. 
          Quando consegui um, ele recusou-se a me levar ao centro. Tive que agir como – imagino - um vero italiano faria: parei de braços abertos em frente ao primeiro que se aproximou e disse que ele  t-i-n-h-a que me levar, pois eu era a próxima na fila. Encontrei um motorista compreensivo que me deu razão.


Rua de Gênova


Uma vez instalada, procedi do mesmo jeito que havia feito em Milão: peguei mapas, escolhi aonde ir, estudei o roteiro, e... pernas pra que te quero. Andei bastante e consegui ver tudo o que queria: a Porta Soprana, a casa em que supostamente nasceu Cristóvão Colombo, as ruas estreitas ao redor do porto, a cidade antiga. 
Sentia-me tão auto-confiante, que "me perdia" de propósito, andando pelas ruas estreitas e labirínticas da cidade antiga apenas para ter a satisfação de, em seguida, consultar um mapa e saber exatamente onde estava.

Cinque Terre




Dois dias depois, saí pela manhã e, ainda pelo caminho, precisei alterar planos por causa de outra greve, desta vez nos trens. 
                  
Eu planejava ir a Cinque Terre e seguir rumo ao sul. Naquele dia, como não queria ficar retida no meio do caminho, fiz uma passagem meteórica pela Riviera Ligure
Fiquei só espiando pela janela enquanto o trem passava pelos vilarejos, um por um, e eu relutando em descer...

Cinque Terre
Meu bilhete terminava em Rio Maggiore. Na estação enfrentei uma fila imensa e caótica de turistas em busca de informações, pois não haveria trens até segunda-feira. 
Tudo o que consegui decidir, sem tempo para pensar direito, foi partir para a cidade vizinha, La Spezia, de onde poderia  pegar outro trem até Civitavecchia antes do início da paralisação geral marcada para 21h. 
Cheguei na cidade em torno de 17h30min com intenção de pernoitar e embarcar no dia seguinte em um dos navios que partiam dali para a Sardenha, meu próximo destino. 
Mas, com a decisão precipitada de pular a etapa Cinqueterre, cheguei sem reserva de alojamento. Péssima surpresa para uma turista-sozinha-de-primeira-viagem: não havia informações turísticas, nada, eu não sabia nem para qual lado sair da estação. Abordei a primeira pessoa que vi e perguntei onde era o centro da cidade e, by the way, já perguntei sobre barcos e horários para a Sardenha.
- “sai um navio às 18h, mas não acredito que você consiga embarcar, pois precisa ir até o porto, um pouco longe daqui, e ainda comprar passagem”.
Como se estivesse participando de uma gincana de velocidade, chamei um táxi que voou para o porto, consegui comprar a passagem, fazer alfândega e embarcar. Com direito a uma cabine privada e banho! Uma noite de merecido sono e, Sardenha, me aguarde!
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Porto de Cagliari, Sardenha
Ledo engano para uma turista ingênua. Cheguei a Cagliari, capital da Sardenha, numa nave cedinho da manhã, de novo sem reserva de albergue. Contava, como sempre, pedir informações turísticas logo na chegada. 
Quase morri de susto ao ver os demais passageiros ir cada um para um lado, todos se distanciando rapidamente até restar apenas eu num porto absolutamente vazio. Eu não sabia nem para que lado ir e fui andando devagar, arrastando minha mala pelas ruas também  vazias. Era domingo e isso, na Itália, significa “tudo fechado”.
Abordei um taxista e perguntei se sabia de um albergue bom a um custo razoável. Sorte de turista principiante, ele ligou pelo celular e, em cinco minutos eu tinha onde ficar, instalada num b & b no centro histórico de Cagliari, capital da Sardenha, em quarto com banho, café da manhã e internet free. Olhei o mapa local e saí para conhecer a cidade.
Finalmente, estava na Sardenha, terra do meu trisavô, que dali partiu em 1847 a fazer não se sabe o que no Brasil. Eu trilhava o caminho inverso. Minha intenção era ficar por uns dias, aproveitando para conhecer o lugar, descansar, parar um pouco de arrastar mala e também tentar pesquisar alguma coisa sobre aquele meu ancestral distante. Minhas buscas resultaram infrutíferas e, depois de uma semana, embarquei outra vez num navio que me levaria para a Sicília.

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