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Pérsia (Irã)

Um olhar (interessado) sobre a Pérsia (Irã)
                                                                   Foto by Samy Adghirni
                                   Teerã - exterior do Palácio Saadat Abad

                Foto by Zélia Leal  





Sara, nossa guia e intérprete
nas cidades de Persépolis
e Shiraz






   Pausa para almoço em
   Isfahan. Eu, Zélia e Chahrzad.
         
        (existe nome mais bonito
        para uma guia na Pérsia?)


Estive andando mais um pouco por aí a conhecer este vasto mundo e ter mais coisas a contar. (Entre as novidades, está saindo na revista Viagem & Turismo deste mês um texto sobre parte da viagem de quatro meses que fiz no ano passado).
Comecei 2012 ensaiando transformar em realidade o projeto de um mochilão a Machu Picchu e lugares próximos. Rabiscava um primeiro roteiro ouvindo músicas, vendo sites, posts e vídeos sobre o voo do condor. Talvez inspirada naquela magnificência, decidi deixar a mente aberta para qualquer oportunidade. E esta apareceu quase instantaneamente na forma de um convite para conhecer o Irã, fazendo companhia a uma amiga em visita ao filho que reside na capital Teerã.
            Foi só o tempo de providenciar visto (obrigatório), passagens, seguro e estávamos num vôo com escala em Frankfurt. Tínhamos cerca de sete horas de espera antes da conexão e tentamos uma breve caminhada pelo centro da cidade. Quase congelamos e tivemos que retornar frustradas à sala de espera do aeroporto.
            Sem muito planejamento no curto período entre o convite e a data de embarque, tudo foi ficando do jeito que eu gosto, ao sabor dos acontecimentos. Desci em Teerã apenas com a minha (minúscula, quase inexistente) imagem do país, construída sobre resquícios de lembranças da História da Pérsia antiga dos meus livros escolares, mais algumas idéias, as mais das vezes estereotipadas, juntando o que vi nos últimos anos na TV, em filmes, jornais e revistas.
            Tive lá meus momentos de receio e ouvi de amigos “te cuida”, entendidos como recados para me manter afastada de terroristas, homens-bomba e situações de desvantagem pela minha “condição feminina”. Eu ficaria mais vulnerável naquele território dominado por um grupo de fanáticos religiosos e seus códigos de conduta rigidamente estreitos no que diz respeito ao comportamento esperado das mulheres em público. 
           Para começar teria que cobrir todo o corpo e usar véu, euzinha, que detesto imposições e ainda mais decretadas por moral religiosa. Para completar, a figura que o país projeta no cenário mundial não ajuda em nada: o Irã enfrenta sanções econômicas por manter um programa nuclear suspeito de objetivos bélicos e parece não se sentir desconfortável quer no papel de alvo para os mísseis israelenses quanto naquele de lançar ameaças a potenciais inimigos a julgar pelas declarações dos seus líderes.


Aviso em um restaurante:
recomendação às mulheres
para que usem o véu islâmico


Tenho meus medos, muitos, mas, como disse meu ídolo Amyr Klink “eu não tenho medo de sentir medo”, então decidi aproveitar a oportunidade de conferir com meus próprios olhos. Pouco me importam governos e mandatários que se alternam em  promessas, apego a cargos vitalícios e leis de tirania  que escondem a indefectível incapacidade de todos para gerenciar os recursos que poderiam melhorar a vida das pessoas comuns. 
                     
               

Experimentando usar o Chador
             
             Gosto mesmo é de ver como vive o povo de um lugar, conhecer seus costumes, comparar, tentar entender. Ademais, poucos países chegam a ter o governo que merecem e a Pérsia continuará sendo maior que seus ditadores de ocasião.
     O véu, que as iranianas usam - muitas o jogam displicentemente sobre os cabelos presos no alto - foi uma das coisas mais difíceis para mim. Não me acostumo com nada sobre a cabeça e os cabelos teimavam em aparecer. Depois, encontrei uma espécie de "touquinha" pronta, só enfiar na cabeça e esquecer. 
     Custei também a aprender a usar (sem reclamar) o "banheiro turco" (simples buraco de louça esmaltada no chão, onde é preciso equilibrar-se e que eu já havia visto como alternativa ao vaso sanitário em pequenas cidades italianas). No Irã, este é quase o único tipo encontrado mesmo em bons hotéis e restaurantes.

     Cheguei entre assustada e curiosa. Saí encantada com as belezas que vi, com a hospitalidade local e com os novos sabores que descobri no tempero dos pratos da culinária iraniana, com as pessoas que tive oportunidade de falar e conhecer, desfrutando o privilégio de ter entrado em suas casas como convidada. Sempre que pedi informações, procurava trocar algumas palavras e encontrei muitas pessoas simpáticas e que demonstravam uma educação primorosa.


        
Ao acordar logo depois da primeira noite em Teerã, espiei pela janela do quarto e tive a sensação indescritível de ver pela primeira vez neve caindo. Os flocos leves como plumas íam se acumulando e tingindo tudo de branco.


Saímos em seguida para a rua,  quando descobri que caminhar sobre a neve que começa a derreter, em ruas sem calçadas, é muito ruim. 
Além de Teerã e sua poluição atroz que encobre a visão das montanhas nevadas no entorno, estivemos também em Persépolis, Shiraz e Isfahan. No interior, nota-se com mais frequencia o costume das mulheres de usar o chador, veste feminina que cobre todo o corpo deixando aparecer apenas o rosto e as mãos. Pena que não deu para conhecer Pasárgada, onde Manuel Bandeira era "amigo do rei".
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Achei curiosa ainda a maneira dos iranianos lidarem com a parte da cobrança em qualquer negociação. No táxi, ao final do percurso o passageiro que perguntar "quanto é" vai receber como resposta "não precisa pagar, não é nada". Lógico que o diálogo não termina de forma tão simples, falta um longo caminho até ambos chegarem a um acordo razoável quanto ao preço. Ouvi dizer que até em restaurantes o valor total só aparece depois das tratativas sobre a "cortesia".
Acompanhei minha amiga a uma loja de tapetes, onde os preços começam em torno de alguns mil dólares e atingem cifras estratosféricas para os meus padrões. As peças foram sendo estendidas uma a uma pelo chão na nossa frente, com explicações detalhadas sobre a origem, o tipo de artesanato, o material usado. O negociante não demonstra pressa nem interesse em "vender" sequer um de dimensões mínimas. 
A beleza ímpar de uma peça bordada em seda, daquelas com motivos poéticos e que leva anos para ser tecida, chegou a me provocar lágrimas. Ao final, preço já acertado depois das "cortesias", ele diz que faz a entrega em qualquer local, incluído o Brasil (país em que revela ter muitos clientes). 
O dinheiro? "Não se preocupe com isso agora". Nada de "sinal de compra", documentos, garantias por escrito. Pode pagar da forma que achar mais conveniente: diretamente no hotel, na operadora de turismo responsável pela nossa ida a Isfahan, ou depósito em uma conta na Suiça, visto minha amiga ter mencionado que estávamos seguindo para lá. Zélia saíu com o tapete, ambas recebemos um brinde e ela só foi pensar no dinheiro alguns dias depois, quase na saída de Teerã. Deixou, conforme sugerido, o valor cash, dólares contadinhos num envelope que entregou ao motorista da agência de viagens.   Negociar assim, realmente é uma arte.
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Persépolis - Relevos nas paredes,
ruínas do Palácio de Dario I

Senti imensa alegria ao ver, tão perto, as longínquas figuras entrevistas há décadas nos meus livros escolares de História.
Persépolis foi antiga capital do império persa no período aquemênida, destruída por Alexandre, o Grande, e é hoje sítio arqueológico com as ruínas dos palácios de Dario e as tumbas de Xerxes, Artaxerxes e Cambises



          Shiraz - seus palácios,
       seus poetas, suas rosas...


Shiraz cultua seus poetas entre palácios e jardins de sonhos (pena não ser primavera).





                                          Isfahan - 
                      Zélia e eu, ao fundo a Ponte Khaju


Praça Naqsh-e jahan

Isfahan é mesmo uma pérola de cidadezinha, com suas pontes de pedra, as mesmas por onde passavam as caravanas na rota da seda. 
Ah, entrar pelo grande portal do Gheisarieh Bazzar e suas centenas de lojas espalhadas por imensos corredores repletos de  artesanato, mosaicos, tapetes, temperos e mil coisas me fez melhor compreender o significado do termo "mercado persa". 

A língua falada no Irã, o persa ou farsi, é a primeira dificuldade com que o turista se depara, logo amenizada por ser o inglês entendido e utilizado por muitos. Os números são escritos em caracteres diferentes, não dá para conferir a nota da compra nem ler as placas dos carros. E a moeda local, o “rial”, faz qualquer um desistir de vez de tentar entender aqueles zeros todos que, suprimidos teoricamente da nota, fazem com que esta passe na prática a valer outra coisa e todos a chamam de "tomã".
A conexão à internet é uma piada. Só conseguia acessar a página do g-mail, nada de Facebook, Google. Tudo passa por um filtro do governo e, quando teclava “enviar”, o texto sumia da tela e sabe-se lá onde ia parar, porque não o encontrava mais nem na caixa de saída como rascunho. Durante o período em que lá estive, o governo “derrubou” a internet por uns três dias seguidos, conseguindo assim desmobilizar uma incipiente manifestação que estaria sendo proposta por um grupo oposicionista. Como eles conseguem trabalhar sem a internet? Bem, muitos usam "contrafiltros" que remetem diretamente a links hospedados fora do país.
“Cuidado ao atravessar a rua” é um conselho para ser seguido à risca na capital cheia de ruas sem passagens calçadas para o pedestre e onde o motorista parece nem saber para que servem os sinais de trânsito.  
Falarei mais vezes sobre este país tão interessante e tão pouco divulgado como destino turístico.
De Teerã seguimos para Genebra, onde minha amiga foi visitar a filha e o genro e eu recuperei meu senso de pertencimento ao mundo dito ocidental fazendo novo giro solo por Amsterdam, Marken, Volendan, Bruxelas, Antuérpia, Bruges, Luxemburgo e Strasburgo, antes de retornar a Genebra e, via Zurique, pegar o voo de volta para São Paulo.
                                     Zélia e eu já na temporada em Genebra
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   Mais sobre Irã/Pérsia aqui neste blog: Persépolis
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Dicas/experiências:

Escritório de Turismo Irã
Mais informações sobre como é viver em Teerã  podem ser conferidas nos textos do jornalista brasileiro que lá reside e trabalha como correspondente Samy Adghirni
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2 comentários:

  1. Assisti-a nos Guerrilheiros da Notícia.
    Vim conhecer teu blog e ler mais a respeito do que presenciastes no Irã.
    Embora curiosa, não tenho vontade de ir.
    Talvez em grupo como fostes ....
    Abraço grande

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    Respostas
    1. oi, Condessa:

      obrigada (pela visita ao blog e pelo comentário). Gosto de viajar e também de contar o que vi. É mais uma forma de trocar experiências com as pessoas.

      Abraço.
      Ira

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